Palácio do Freixo
A famosa moradia foi construída nos meados do séc. XVIII por um rico cónego da família nobre dos Cernaches, Jerónimo de Távora, senhor de grandes riquezas na província de Entre Douro e Minho e herdeiro de outro abastadíssimo eclesiástico, o cónego D. João Freire, deão da Sé do Porto, cujos bens haviam sido acumulados por uma dama da família dos Cernaches, de nome D. Micaela Freire. Essa fortuna constituía uma espécie de condado, abrangendo propriedades em Coja, Macieira, Gaia e Baião. Nicilau Nasoni, recém-vindo de Itália, foi incumbido de gisar o plano do sumptuoso palácio que o referido cónego se propôs implantar naquele belo sítio, defronte do cristalino meandro do rio Douro. Os jardins, talhados à maneira italiana, foram repartidos por arquitectónicas alamedas de balaústres e povoados de esculturas alegóricas. Ao longo do rio corria um varandim (bastante desmantelado pela grande cheia de 1909), que oferecia, e ainda oferece, seus encantos panorâmicos. No interior, o palácio recebeu sumptuosos lavores, em estuques, pinturas a fresco, espelhos e lustres. (O mais valioso dos lustres, segundo se diz, está num museu suíço). As armas dos Távoras ostentavam-se em diversas partes do edifício. Sobrevindo o processo judiciário do regicídio (1758), o palácio, como tantos outros da poderosa estirpe, foi visitado pelas alçadas do Marquês, incumbidas de picar todos os sinais heráldicos dos fidalgos condenados. Em fins do séc. XVIII, o palácio, bastante decadente, passou para os viscondes de Azurara, que, por seu turno, o venderam a um negociante, um tal António Afonso, que o mandou restaurar e ao mesmo tempo estabeleceu, ao lado, uma fábrica de sabão. Era o mofino precedente. Nos nossos dias outro grande industrial adquiriu o edifício e os jardins, instalando nestes a fábrica de moagem, à qual recentemente acrescentou um enorme silo, de 45 metros de altura. Assim se tornou irreparável a asfixia desta tão interessante obra de arquitectura da melhor época barroca. A visita ao palácio confrange. Mesmo assim, vale a pena fazê-la. A autorização, um pouco custosa, terá de obter-se na própria fábrica.
... a nota dominante é a do abandono. As esculturas decorativas, de calcário, que se encontram ainda, nas suas penhas, na fachada voltada ao N., têm todo o ar de figuras petrificadas pelo zumbido industrial e o tapume de chapas enferrujadas que as envolve.
in "Guia de Portugal" [Entre Douro e Minho I - Douro Litoral], Fundação Calouste Gulbenkian, 1964 |
De linhas aristocráticas, o Palácio é, do ponto de vista arquitectónico, um edifício único na cidade e um dos mais belos legados de Nicolau Nasoni, e do barroco, ao Porto.
Entra-se no edifício pelo lado ou pelas traseiras, o que era habitual no século XVIII. A fachada principal dá para o rio Douro, com uma vista soberba. Nasoni tirou partido do desnivelamento do terreno e ligou o palácio ao rio através de jardins com socalcos.
Foi classificado monumento nacional, em 1910. Apesar disso, foi vítima da industrialização (até de uma fábrica de carvão, a poente) da zona em que se encontra e votado ao abandono por parte das autoridades que tinham o dever de demarcar a zona de protecção a um edifício desta importância.
Terminada a exposição de Salvador Dalí, o Palácio vai ser entregue, juntamente com a antiga Fábrica das Moagens Harmonia, ao Grupo Pestana para mais uma Pousada de Portugal, a abrir em 2009.
Entre 2000 e 2003, foram feitas as obras de recuperação do Palácio (que custaram 10 milhões de euros), sob a responsabilidade dos arquitectos Fernando Távora (que veio a falecer em 2005) e de seu filho José Bernardo Távora. Na altura, chegou a estar prevista a criação, nesta zona, dum pólo cultural que incluía a construção do Pavilhão das Descobertas, um passeio pedonal junto ao rio, ateliês e exposições para diferentes públicos.
O edifício estava num estado lastimável, devido a anos de abandono e aos estragos feitos pelos sucessivos proprietários. Fez-se o possível por manter o que havia de original, sem pretender refazer ou tentar copiar, mantendo a memória de quem aqui esteve. Uma equipa de restauro de Tomar trabalhou intensamente, durante quase um ano, na recuperação de parte dos traços de Nasoni. Facilmente se encontram espaços vazios e rabiscados nos tectos e nas paredes trabalhados e pintados, deixados como se encontravam.
Houve a grande preocupação de usar materiais das artes tradicionais e não utilizar betão. Nalguns espaços, teve de ser recriado o que havia sido destruído, como as janelas (onde agora se vê o granito, mas que estavam tapadas de madeira) e a escada interior teve de ser refeita porque tinha desaparecido o segundo patamar.